O brasileiro está preparado para sites de apostas online?

O brasileiro está preparado para sites de apostas online?

Hamilton Almeida

Milton Carlos Silva

Advogados

As casas de apostas online são hoje uma realidade no Brasil. Elas estão dominando, por exemplo, os patrocínios de clubes de futebol da Série A do Campeonato Brasileiro, sendo que apenas 5 dos 20 times não são patrocinados por essas casas. O valor do repasse ultrapassa R$ 450 milhões de reais.

Segundo Fábio Wolff, sócio da Wolff Sports e especialista em marketing esportivo, em reportagem para o UOL, “O segmento das apostas é um dos grandes responsáveis pelo aumento vertiginoso dos valores dos contratos de patrocínios em geral nos últimos anos. A demanda tem sido maior do que a oferta, e isso tem feito com que números se multipliquem.”

Os jogos esportivos online foram regulamentados pela Lei n.º 14.790/2023, sendo sancionada em dezembro do mesmo ano, permitindo a atuação de empresas privadas no segmento. Porém, deveria o Brasil ter permitido esses jogos?

Essa é uma dúvida legítima, pois no Brasil os jogos de azar sempre foram proibidos, justamente porque esses jogos são dominados pela máfia, que utiliza cassinos e casas de apostas para lavar dinheiro do tráfico de entorpecentes e outras atividades ilegais, além de causar vício e destruição de famílias mundo afora.

No Brasil, tem surgido um outro grave problema além desses descritos no parágrafo anterior que pouca gente tem alertado. O brasileiro está se endividando nessas casas de apostas online e usando todos os recursos que guardam na poupança para tentar a “sorte”.

As classes de renda mais baixa (C, D e E) são as que mais tem participado dessas apostas e as que mais estão perdendo dinheiro, na expectativa de tirar a sorte grande e ficarem ricos de maneira fácil.

Segundo um dado revelado pela XP Investimentos, baseado em informações da BNL, uma plataforma agregadora de apostas online, o mercado brasileiro de apostas movimentou cerca R$ 100 bilhões a R$ 120 bilhões em 2023, equivalente a 1% do PIB brasileiro. Para se ter uma ideia, nos EUA foi apostado cerca de U$ 100 bilhões, representando apenas 0,4% do PIB, mostrando que o brasileiro gasta mais proporcionalmente que os Estados Unidos.

Conforme apontou a XP, entre os principais destaques do estudo, estiveram que: 64% dos que apostam online no Brasil utilizam sua principal fonte de renda para apostar; 63% dos que apostam no Brasil afirmam que teve parte de sua renda comprometida com apostas online e, em termos de implicações para o consumo, 23%, 19% e 14% dos que apostam online afirmam que se abstiveram de comprar vestuário, alimentos e produtos de higiene pessoal, respectivamente.

Nessa pesquisa, foi levantado que 25% da população já fez apostas online, contrastando com apenas 2% que investem na Bolsa de Valores.

Outro estudo feito pelo Instituto Locomotiva mostra que 51% dos brasileiros utilizam recursos que iriam para poupança e 48% tem redirecionado o dinheiro gasto em bares, restaurante e delivery. Outros 45% desviaram de outros tipos de jogos, como lotéricas e 41% da compra de roupas e assessórios.

Num estudo feito pelo banco Santander, ao analisar os dados nominais de vendas no varejo do IBGE e da Renda Nacional Disponível das Famílias do Banco Central de 2013 a 2023, o banco conseguiu rastrear como as atividades do varejo evoluíram em função do poder de compra do brasileiro, para verificar se os jogos de azar estão tendo um efeito no deslocamento dos recursos do brasileiro.

E a equipe do banco chegou à conclusão de que a participação das vendas no varejo amplo na renda familiar caiu de um pico de 63% em 2021 para 57% em 2023, enquanto as atividades de jogos de azar legalizados registraram um aumento significativo, subindo de 0,8% da renda familiar em 2018 para uma fatia aproximada de 1,9% a 2,7% em 2023.

Todos esses estudos e pesquisas citados acima mostram a nítida a tendência de transferência de recursos do brasileiro para as casas de apostas, tornando-se hoje o principal concorrente do Comércio brasileiro como um todo.

Os brasileiros estão literalmente deixando de comprar itens de higiene pessoal para se endividar nas “bets” online, mostrando que, talvez, não esteja preparado para a legalização das apostas online.