Artigo - A nova lei complementar resolve a não incidência do ICMS nas transferências de mercadorias

Artigo - A nova lei complementar resolve a não incidência do ICMS nas transferências de mercadorias

Hamilton Almeida

Milton Carlos Silva

Advogados


Nos últimos dias de 2023 foi sancionada a Lei Complementar 204/2023, trazendo importante alteração na Lei Complementar 87/1996. Os legisladores pretenderam apaziguar uma questão que há muito era debatida nos tribunais.

Os Estados sempre lutaram contra as incontáveis decisões judiciais que determinavam a não incidência do ICMS nas transferências de mercadorias de um estabelecimento para outro, de um mesmo titular, principalmente se essa transferência acontecesse entre estabelecimentos localizados em estados distintos.

A partir de uma sentença feita no Estado de São Paulo, ainda tratando do extinto ICM, que considerou a não incidência do tributo nas remessas para outro estabelecimento da mesma empresa e que, em seguida, foi confirmada pelo STJ, criando a Súmula 166 do STJ, deveria ter terminado a controvérsia.

A Súmula do STJ era clara, de fácil compreensão, ao determinar que não incidia o imposto nas remessas de mercadorias entre estabelecimentos de um mesmo contribuinte, porém não cessou a luta dos Estados pela cobrança do ICM e depois ICMS, quando da edição da Lei Complementar 87/1996 – Lei Kandir –, onde foi aprovado um dispositivo na lei que ressuscitava a ilegal cobrança.

O dispositivo considerava ocorrido o fato gerador do ICMS no momento da saída da mercadoria do estabelecimento do contribuinte, “ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular”.

Parece indubitável que a redação dada pela Lei Kandir, mesmo quando a remessa fosse entre estabelecimentos do mesmo contribuinte, teria a incidência do ICMS tal operação.

Mas a palavra “circulação” que consta no enunciado do imposto, segundo a jurisprudência do STJ como do STF, tem significado restrito, não se aplicando a toda circulação, mas tão somente a circulação jurídica, isto é, quando há mudança de dono da mercadoria.

O simples deslocamento de um para outro estabelecimento do mesmo titular não deve ser objeto de incidência do imposto.

A recente solução dada à ADC 49 pelo STF obrigou a alteração da Lei Kandir, motivo pelo qual foi criada a Lei Complementar 204/2023.

Nessa lei foi alterado o artigo 12, Inciso I, da Lei Kandir, retirando a expressão original: “ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular”.

Mas não parou apenas nessa alteração feita à LC 087/1996.

Foi incluído o parágrafo quarto, Incisos I e II, ao artigo 12, na Lei Kandir, com a redação seguinte:

§ 4º Não se considera ocorrido o fato gerador do imposto na saída de mercadoria de estabelecimento para outro de mesma titularidade, mantendo-se o crédito relativo às operações e prestações anteriores em favor do contribuinte, inclusive nas hipóteses de transferências interestaduais em que os créditos serão assegurados:

I - pela unidade federada de destino, por meio de transferência de crédito, limitados aos percentuais estabelecidos nos termos do inciso IV do § 2º do art. 155 da Constituição Federal, aplicados sobre o valor atribuído à operação de transferência realizada;

II - pela unidade federada de origem, em caso de diferença positiva entre os créditos pertinentes às operações e prestações anteriores e o transferido na forma do inciso I deste parágrafo.

Podemos ver com precisão que a nova Lei Complementar definiu a não ocorrência de fato gerador do ICMS para as transferências entre estabelecimentos de um mesmo contribuinte. Nos Incisos I e II procurou aclarar a questão dos créditos para as mercadorias que estão sujeitas a mercancia, ou seja, mercadoria para revenda, cujos créditos do ICMS incorporados na escrita fiscal do estabelecimento remetente, poderá ser transferido para o estabelecimento de destino, obedecidas as regras ali contidas.

Haverá quem duvide do acerto jurídico desses dispositivos. Sempre é possível que nasça uma questão de como transferir crédito se não há incidência do imposto nessas operações.

Teremos então, novos capítulos na novela referente aos créditos para que haja novas investidas dos Estados nesse caso das transferências. Quem viver, verá!